Não dá para negar que ao ouvir o termo “compaixão” nossa mente encontra significados diversos e um pouco confusos, né?! E “compaixão” unida com “psicoterapia” pode parecer ainda mais estranho! Por isso, antes de iniciarmos a nossa conversa, vamos esclarecer que para a TFC a compaixão é “sensibilidade ao sofrimento com comprometimento em tentar aliviá-lo e preveni-lo” (Gilbert, 2021). Bem mais simples do que parecia, não acham?
Mas então, o que é a Terapia Focada na Compaixão e como ela se difere das outras teorias psicológicas?
O primeiro ponto que precisamos entender é que a TFC é uma abordagem biopsicossocial de psicoterapia baseada na psicologia evolucionista. Isso significa que toda a compreensão do indivíduo e do seu sofrimento será contextualizada com base no funcionamento de um cérebro e uma mente que vêm se desenvolvendo e se moldando ao longo de milhões de anos, buscando sobreviver e prosperar nas adversidades e perpetuar a sua existência da melhor forma possível. Andamos por aí carregando mentes feitas PARA nós, e não POR nós. E ainda assim, nos culpamos e sentimos vergonha por ser, pensar, sentir e agir do jeito que agimos! É claro que não é nossa culpa, afinal somos produtos de um cérebro que evolui e age de acordo com forças que não controlamos (e as vezes sequer conhecemos). Entretanto, é uma premissa básica da TFC que é nossa responsabilidade buscar ter consciência de quem somos para que possamos fazer escolhas sábias e sermos úteis a nós mesmos e a humanidade.
Quando surgiu a Terapia Focada na Compaixão?
O criador da TFC é um cara incrível chamado Paul Gilbert, que ao trabalhar na Escócia com pacientes gravemente deprimidos na década de 70 percebeu que o alcance das mudanças atingidas em psicoterapia era pequeno: mesmo que os clientes aprendessem a “pensar de forma saudável”, muitos seguiam não se sentindo bem. E isso acrescentava novas camadas ao sofrimento dos clientes, que se criticavam e envergonhavam por ainda estarem com dificuldades. Assim, parecia haver um dilema entre saber X sentir que a psicoterapia não conseguia tocar, e para encontrar soluções Gilbert mergulhou fundo na ciência evolucionista, nas práticas contemplativas e nos modelos neurofisiológicos do desenvolvimento (especialmente a Teoria do Apego e Teoria Polivagal). E foi dessa mistura boa que surgiu a TFC!
Qual o principal objetivo da TFC?
A Terapia Focada na Compaixão compreende que a vergonha e o autocriticismo estão no cerne do sofrimento das pessoas, trazendo dificuldades inclusive na relação terapêutica e nos resultados da psicoterapia. Então, nosso principal objetivo na TFC é o desenvolvimento da compaixão em seus três fluxos (de mim para os outros, dos outros para mim e a autocompaixão) para diminuir a vergonha e a autocrítica.
Além disso, a TFC defende que temos mentes múltiplas e complexas, com potenciais incríveis para o cuidado, o amor, a compaixão e o crescimento. Porém é necessário considerar que existem potenciais igualmente importantes para a crueldade, a insensibilidade e a dor.
Portanto, precisamos conhecer nossa mente para que ela se torne nossa aliada, e não nossa inimiga! Assim, consideramos a psicoeducação sobre o funcionamento e evolução da mente uma parte imensa da psicoterapia.
Quais os benefícios da TFC?
Não faltam evidências científicas para nos mostrar os benefícios do cultivo da compaixão – desde melhora da saúde do coração até aumento nos comportamentos pró-sociais, parece não haver contraindicações para a TFC e a compaixão. Mesmo em outras abordagens de psicoterapia, o desenvolvimento da compaixão no terapeuta está diretamente relacionado à maior adesão dos clientes no tratamento e aumento na percepção de sucesso da terapia (tanto por parte do cliente quanto do terapeuta). E cá entre nós: como não concordar que ajudar as pessoas a se tornarem conscientes do próprio cérebro e a desenvolver habilidades para perceber, aliviar e prevenir o sofrimento é algo incrível?
Para quem a TFC é recomendada?
Vamos pensar aqui um exercício rápido: imagine que você marcou de encontrar uma amiga querida para um café. Vocês não se falam há muito tempo e você passou dias esperando por aquele encontro. Você já está pronta e a caminho da cafeteria quando sua amiga manda mensagem avisando que teve um imprevisto e precisa cancelar o encontro de vocês. Como você se sente? O que você sente por ela nesse momento? Possivelmente você (assim como eu) se sente frustrada, injustiçada e triste, e é invadida por sensações de raiva. Se nos deixarmos levar por essas sensações, podemos mandar uma mensagem bem desaforada para a amiga e prometer a nós mesmas que nunca mais iremos marcar nada com ela. Mas então ela responde a nossa mensagem desaforada pedindo desculpas e explicando que está lidando com uma emergência de saúde de alguém da sua família. Certamente nesse ponto, você se sentirá culpada e pensará coisas do tipo “que amiga horrível eu sou, como pude pensar e falar aquelas coisas?! Quem nunca mais irá querer sair comigo é ela, e eu mereço. Fui uma péssima amiga!”. E é aqui que a TFC mostra a sua beleza: ao compreendermos que nossa reação raivosa foi uma programação automática da mente à percepção de injustiça e aprendermos a ouvir essa culpa e autocrítica que nos fazem sentir um monstro por ter agido de acordo com a raiva, ganhamos a liberdade da responsabilidade. Eu SEI que agi de acordo com a raiva e PERCEBO o quanto isso me afastou da amiga que quero ser. Eu SINTO a culpa por ter agido dessa forma, e entendo que ela me aponta o caminho para a reparação dessa relação. Isso é compaixão em ação: não é sobre ser perfeita ou deixar de “errar”. É sobre aceitar a nossa humanidade e se responsabilizar por ela. E isso é recomendado para absolutamente qualquer pessoa <3
O centro de valorização da Vida realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo de forma voluntária. Para conversar acesse os links abaixo.